Atendimento ao cliente | pesquisa revela que consumidor também acordou no Brasil e as empresas pioraram

quarta-feira, agosto 14, 2013 Jony Lan 0 Comments

Atendentes da Avianca: eles ganharam viagens para que entendessem melhor os clientes

Os brasileiros estão mais exigentes não apenas com o governo. A cobrança sobre as empresas também cresceu — o que derrubou a média geral do ranking EXAME/IBRC de Atendimento ao Cliente.

Nas últimas semanas, os brasileiros foram às ruas protestar contra quase tudo — do preço das passagens de ônibus ao número de ministérios. Não se viram consumidores carregando cartazes para exigir melhor atendimento de varejistas, operadoras de telefonia, fabricantes de eletrodomésticos, mas o sentimento de indignação parece ter chegado também às empresas.

O quarto ranking EXAME/IBRC de Atendimento ao Cliente revela que, pela primeira vez, a nota geral das empresas caiu. Realizado pelo Instituto Brasileiro de Relacionamento com o Cliente (IBRC), trata-se da mais importante pesquisa sobre qualidade de atendimento feita no país.

A análise é dividida em quatro etapas. Primeiro, o IBRC ouve mais de 3 000 consumidores em 99 cidades para descobrir por quais empresas foram bem ou mal atendidos. Depois, envia um questionário às companhias, realiza testes com clientes ocultos e faz uma rodada de conversa com os clientes das 100 empresas mais citadas.

Ao final de quatro meses, chega ao ranking das 50 melhores e das 50 piores, e à média final da qualidade do atendimento. Aí entra a má notícia: a média caiu de 63,5 para 58,5 pontos num total de 100 — é o pior resultado desde o primeiro levantamento, em 2010. Dos 3 000 entrevistados, 680 disseram que não foram bem atendidos por nenhuma empresa — ante 398 em 2012.

É uma queda inédita, mas esperada por quem acompanha de perto essa relação potencialmente conflituosa. “Há um descompasso: os clientes ficaram mais exigentes e as empresas não investiram para acompanhá-los”, diz Alexandre Diogo, presidente do IBRC. É uma evolução natural no país.

Ao longo da última década, mais de 30 milhões de brasileiros ascenderam na pirâmide social e passaram a ter acesso a produtos e serviços antes inalcançáveis. Agora, eles não se contentam mais em ter o celular da moda, ou em conseguir fazer compras pela internet. Querem ser bem tratados.

Essa mudança no comportamento do consumidor foi acelerada pela expansão maciça de redes sociais como o Facebook — onde uma opinião negativa pode se multiplicar entre dezenas ou centenas de amigos virtuais — e coincidiu com um momento de frea­da na economia. Para conseguir manter a rentabilidade em um ano de crescimento anêmico, como foi 2012, as empresas seguraram seus investimentos.

E, nesse cenário, áreas responsáveis pelo relacionamento com o consumidor — como treinamento — tiveram seu orçamento reduzido. “Os executivos cortaram na qualidade do serviço, o que é um erro”, afirma Paulo Góes, diretor executivo do Procon em São Paulo.

Cliente em segundo plano

Como mostram os resultados do ranking EXAME/IBRC, o consumidor não perdoa ser deixado em segundo plano. Mesmo empresas que foram destaque em edições anteriores despencaram desta vez. Foi o que aconteceu com as empresas de telefonia Nextel, que teve a maior queda (38 posições), e GVT (caiu 26 posições), e com a concessionária de energia elétrica Cemig (caiu 36).

Depois de anos de forte crescimento na receita, a Nextel decidiu terceirizar as áreas de engenharia e de cobrança. A qualidade do sinal caiu e aumentou muito o envio de faturas com atraso e contas indevidas, o que enfureceu os clientes. Em 2011, a empresa era a 25ª do ranking de atendimento. Agora está na 80ª posição. O lucro caiu 54% de 2011 a 2012.

Em comunicado, a Nextel diz que internalizou as áreas novamente em 2013 e aumentou os investimentos em qualidade. Já a GVT, que foi a 24ª colocada do ranking em 2012 e agora está na 50a posição, enfrentou dificuldades com a implantação de seu novo serviço de TV por assinatura — quedas de sinal eram frequentes.

Como a empresa instalou milhares de novos pontos pelo Brasil, a equipe de atendimento acabou sobrecarregada. Apenas em novembro a GVT criou uma diretoria de qualidade, que assumiu o serviço de atendimento — mas não a tempo de evitar uma queda no ranking. A Cemig diz que obras de manutenção da rede no fim de 2012 resultaram em mais interrupções de serviço do que o esperado. A empresa ficou na 81a posição.

Em anos anteriores, empresas de telefonia e comércio eletrônico foram apontadas como as vilãs do ranking. Agora dois novos setores estão levando a paciência dos consumidores ao limite: os serviços de TV por assinatura e os planos de saúde. Ambos tiveram saltos expressivos de demanda — a TV paga cresceu 30% ao ano nos últimos três anos, e 9 milhões de brasileiros viraram clientes dos planos de saúde.

O crescimento acelerado, porém, esbarrou na falta de investimento em serviço e atendimento para sustentar a expansão. A operadora de TV por assinatura Sky caiu 17 posições — no Procon-SP, as queixas contra a empresa aumentaram 200% no último ano.

A companhia que ficou na última posição do ranking neste ano, a operadora de planos de saúde Intermédica, teve 85% de citações negativas na primeira fase da pesquisa, aquela em que os consumidores falam espontaneamente sobre experiências boas e ruins de atendimento. As principais críticas foram em relação ao troca-troca de profissionais da rede credenciada. Procuradas, Sky e Intermédica não deram entrevista.

A alta rotatividade de funcionários, aliás, foi apontada pelas empresas como um dos principais problemas para manter a qualidade do atendimento. Não por acaso, cadeias de restaurantes, como McDonald’s, Bob’s, Habib’s e Giraffas, que, na média, trocam 100% de suas equipes ao longo do ano, ficaram entre as 25 piores do ranking.

“Viramos mais uma empresa de contratação e treinamento do que de lanches”, diz Marcello Farrel, diretor do Bob’s. “É impossível manter um padrão de atendimento nesse cenário.” O Bob’s chegou a reduzir em um terço o tempo de treinamento dos funcionários para evitar que faltasse gente para­ atender nas lanchonetes.

Durante a elaboração do ranking, o IBRC pergunta para ao menos 500 atendentes das 100 empresas quando foi a última vez que eles participaram de um treinamento. Do ano passado para cá, a resposta “Não lembro” subiu de 38% para 57%. Segundo o treinador de vendedores Wilson Mileris, que atende empresas como o Grupo Pão de Açúcar e o banco Itaú, o número de companhias que contratam cursos caiu pela metade em 2012. “A principal justificativa é corte de custos”, diz.

O levantamento do IBRC ainda apontou que o número de queixas de consumidores de descortesia no atendimento mais que triplicou de um ano para cá. Além de mal atendidos, 11% dos clientes ainda ouvem desaforos dos funcionários.

Mesmo com tantas dificuldades, um grupo de empresas conseguiu crescer sem fazer da vida do cliente um inferno. Em 2012, a companhia aérea Avianca aumentou em 80% a receita e subiu 23 postos no ranking EXAME/IBRC, ficando na 15a posição. Um dos trunfos foi dobrar a equipe de atendimento, que agora tem 300 pessoas.

Nesse processo foi identificado um gargalo: alguns funcionários tinham dificuldade de entender as reclamações dos clientes porque nunca tinham viajado de avião. A companhia passou, então, a dar viagens gratuitas para a equipe. Mudanças quase banais também podem melhorar a percepção do cliente.

O banco Ibi, do grupo Bradesco, ficou entre as cinco piores do ranking no ano passado. Ao analisar os motivos, o banco descobriu que o e-mail para contestação de despesas no cartão de crédito, um dos serviços mais requisitados, tinha 23 caracteres antes do sinal de arroba — os clientes demoravam 85 segundos para anotar. Agora tem só sete.

O Ibi também descobriu que 97% de seus clientes tinham razão ao contestar despesas na fatura. Hoje, quando recebe uma queixa, lança o estorno logo na próxima conta — antes investigava cada caso, o que poderia atrasar a devolução em até dois meses. Neste ano, o Ibi subiu 28 posições.

Para quem foi mal, a má notícia: todos os sinais são de que o consumidor ficará cada vez mais exigente. Um primeiro passo para melhorar essa relação é confiar na honestidade dos clientes. “Nos Estados Unidos, há décadas o consumidor pode mudar de ideia em relação a uma compra e receber o dinheiro de volta, sem questionamentos ou burocracia”, diz Luiz Fernando Turatti, professor de estratégia do Insper. Nesse quesito, as empresas brasileiras andaram para trás.

Abs, 

Jony Lan
Especialista em estratégia, marketing e novos negócios 
jonylan@mktmais.com

Fontes: Exame

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