Modelo de negócios | Um metrô que dá lucro, a MTR de Hong Kong tem até capital aberto na bolsa de valores
Ao transformar estações em shopping centers, a companhia de metrô de Hong Kong consegue o que parecia impossível: operar sem ser um peso para o governo. Eis um exemplo a ser copiado. Mas será que o governo vai querer?
Quem circula pelas principais estações de metrô de Londres percebe que 2013 é um ano de festa. A reedição de cartazes antigos com avisos aos passageiros e a exposição de obras de artistas britânicos contemporâneos fazem parte da programação para comemorar o aniversário de 150 anos do tube, o primeiro metrô do mundo. Desde o seu começo, esse sistema de transporte urbano foi um sucesso de público.
Os londrinos fizeram fila para ser os primeiros a viajar pelos cerca de 5 quilômetros entre as estações de Paddington e Farringdon. E Londres inspirou o mundo. Hoje, toda cidade que se preze tem uma rede subterrânea — há cerca de 400 no mundo. Mas, se é imbatível em eficiência, o metrô nunca conseguiu deixar de ser um peso enorme para os governos.
Cada quilômetro de trilhos subterrâneos chega a custar 1 bilhão de reais. Como o valor da empreitada é alto, mas o preço do bilhete precisa ser baixo para não afastar os passageiros, a conta só fecha com um pesado subsídio do governo.
A MTR, empresa de transporte urbano de Hong Kong, mostra que é possível quebrar esse padrão. Como muitas empresas de metrô não publicam balanço, não há um ranking das mais eficientes. Mas é quase consenso no setor que a MTR é a mais lucrativa do mundo. A exploração imobiliária é o que faz a diferença.
A empresa constrói prédios e centros comerciais nos terrenos acima das estações. No total, administra 12 shoppings e 20 andares de escritórios no maior edifício de Hong Kong.
Seu braço imobiliário respondeu por mais de um terço do lucro de 1,9 bilhão de dólares registrado em 2012. A MTR também se beneficia de uma conjuntura favorável. Hong Kong é um caso especial em termos de uso do transporte público.
Enquanto a média mundial é 360 viagens anuais por pessoa, na ex-colônia britânica esse número chega a 525. Lá, cerca de 75% dos deslocamentos são feitos em ônibus ou vagões de metrô — em São Paulo, são 38%, e no Rio de Janeiro, 46%.
Sempre operando no azul, a MTR é elogiada por instituições financeiras e agências de avaliação de risco. Para a Moody’s, sua liquidez é alta e assegura os investimentos futuros. Até 2020, o plano da empresa é construir cinco linhas, com um acréscimo de 56 quilômetros (hoje, o total é de 218 quilômetros — o metrô de São Paulo, o maior do Brasil, tem 74 quilômetros).
“O modelo é muito eficiente durante um processo de expansão de novas linhas porque torna os projetos viáveis financeiramente”, diz Peter White, professor de transporte público na Universidade de Westminster, em Londres.
Foi inspirado na MTR que o governo de São Paulo fez o edital da Linha Laranja do metrô da capital paulista, a primeira no Brasil a ser construída e operada integralmente pela iniciativa privada. O vencedor da licitação, prevista para maio, poderá construir e explorar imóveis no perímetro das estações. Com isso, o governo pretende diminuir sua parte do investimento.
Em vez de financiar 80% da obra, como aconteceu na construção da Linha Amarela, a última a ser completada, desta vez o estado participará com apenas 50% dos 7,8 bilhões de reais previstos para o empreendimento.
“Como os valores são sempre vultosos, é difícil eliminar os subsídios do governo. Mas é possível aumentar a participação da iniciativa privada”, diz Antony Chin, professor de economia da Universidade Nacional de Singapura.
Os países que não seguem por essa linha acabam apelando para o aumento da arrecadação. Na Alemanha, parte dos investimentos em transporte público é bancada por taxas sobre a emissão de poluentes. Outros países criam pedágios urbanos. No caso da MTR, o governo financia a expansão apenas indiretamente — ele é dono de 80% das terras de Hong Kong e cede os terrenos a ser usados.
Próxima estação: compras
A MTR é mestre no que especialistas do setor costumam chamar de “receitas acessórias”. A empresa ganha dinheiro com espaços publicitários e aluguéis dentro das estações, todas elas planejadas para vender de tudo.
No metrô de Hong Kong é possível encontrar supermercados, salões de cabeleireiros, bancos, lojas de roupas e até agências de viagens. Em maior ou menor medida, esse é o modelo usado nas concessões da MTR no exterior — a companhia está presente em Londres, Estocolmo, Pequim e Melbourne.
Controlada pelo governo de Hong Kong, a empresa iniciou uma agressiva expansão internacional no ano 2000, quando abriu o capital na bolsa de valores. “O curioso é que hoje a MTR é considerada uma eficiente administradora de shoppings, não só uma empresa de transporte”, diz Roberto Fantoni, sócio da consultoria McKinsey em São Paulo.
O modelo de negócios da MTR está sendo aplicado no restante da China, o país que mais constrói linhas de metrô — de 2009 a 2015, serão 2 000 quilômetros. Lá, explorar os imóveis nas imediações das estações agora é a regra.
Abs,
Jony Lan
Especialista em estratégia, marketing e novos negócios
jonylan@mktmais.com
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Fonte: Exame