Luxo | Elas não são só ricas e bem nascidas. Elas são Ablackers
Quer entender o mercado de luxo? Conheça um pouco mais as consumidoras dessa classe social.
“Alguém conhece um motorista que fale português em Lyon?”. Essa é apenas uma das dúvidas facilmente solucionadas pelas integrantes da Agenda Black
Elas são ricas, bem nascidas, muito bem informadas – mas às vezes têm dúvidas cruéis. Elas são Ablackers. Trata-se das integrantes da Agenda Black, um grupo seletíssimo e fechado do Facebook, composto basicamente de mulheres da alta sociedade paulistana, com sobrenomes capazes de abrir as portas de qualquer endereço exclusivo europeu.
Elas dão dicas de viagens, respondem a interrogações cotidianas e dividem informações para facilitar o day by day (como costumam falar). “Alguém conhece um motorista que fale português em Lyon?”, por exemplo. Ou: “Gostaria de dicas de presentes bacanas para aquela amiga ‘que já tem de tudo’ ... hj tô sem inspiração ..!! Tks !!”, “Meninas, alguém conhece um bom médico em Los Angeles-CA?, vou com a família passar uma temporada por lá”, “O que vcs fazem pra limpar e manter limpas as bolsas de couro coloridas, no dia-a-dia? Como instruir as empregadas pra fazerem isso sem dar produto que estrague?”.
O grupo é quase impenetrável – não basta ser “amigo de amigo”, tem que ser amigo “do” amigo –, mas as regras para quem está dentro são mínimas. Não é permitido publicar ofensas ou insultos, nem anunciar produtos. “Aqui não é classificados nem Mercado Livre”, informa Titina Bilton, idealizadora e moderadora do grupo.
As respostas para as dúvidas postadas no grupo são quase instantâneas. Para quem “tem tudo”, nada melhor do que dicas de presentes de quem também já tem tudo: “Outro dia ganhei a borboleta da sorte de cristal baccarat e amei”, sugere alguém. “Acabei de dar uma lupa da Le Lis Blanc, com cabinho em osso todo trabalhado para uma amiga chiquérrima , e ela AMOUU!!!”, conta outra. “Um Tag para mala da Tiffany na cor turquesa. Outra ideia um porta-tabasco de prata da Galeria das Pratas”. Procura-se “um presente criativo para um recém-nascido (menino)”? Argolas para guardanapo gravadas com as iniciais (“Um mimo chique de gente chique! Bjs”, avisa uma Ablacker).
Se você tem kids (o inglês e o português são frequentemente fundidos nas frases), a Agenda Black é o paraíso das mommies. Outro dia uma delas quis dicas para o aniversário da filha de 9 anos: “Fiz festa do pijama, com limousine, no Hilton”, contou uma Ablacker. “Fechei alguns quartos e as meninas dormiram lá, com direito ao dia seguinte na piscina coberta, massagem e almoço. Se for verão tem outras opções de hotéis, mas a piscina coberta do Hilton no inverno ajudou muito!”.
Nada fica sem resposta. “Gostaria de saber onde encontrar aquelas capinhas para proteger só os ombros dos blazer dentro do armário”. Capinhas? Proteger só os ombros? O enigma não durou cinco minutos: “Faço as minhas em piquê branco com a costureira Raquel. Fácil de lavar e está sempre nova. Para ternos sem detalhe, com bordado”. Elas realmente sabem tudo.
“Alguma personal shopper brasileira em NY?” Se para o restante da humanidade a pergunta nem passaria pela cabeça, para as Ablackers ela é genérica demais: “Vc quer uma que seja autônoma ou de alguma loja de depto?”. As vezes não é preciso nem perguntar que as dicas aparecem: “Para quem tem malas TUMI e precisa fazer manutenção, a loja 53 West, 49th Street , conserta sua mala, te entrega no hotel, procure a Andrea Atticot , mega atenciosa e querida!”.
Para quem não entendeu direito as indicações, o endereço fica em Nova York. Vai viajar? A agenda tem um documento específico só para listar as melhores vendedoras das melhores lojas nas melhores cidades do mundo. Desde a Vanessa, da Mixed do Shopping Iguaremi (“Super fofa!!”), até a Krishna Fabiani, da Prada de Nova York (“que é uma queriiiida”).
“O sucesso da lista mostra como o público AAA estava carente de informação”, observa Titina. Aos 39 anos, mãe de três filhos e casada com um empresário, ela inicialmente convidou 300 amigas para trocar informações e solucionar dúvidas que as atormentavam diariamente. Em duas semanas, o grupo – que até então era aberto ao público – tinha 2.400 membros. Foi quando Titina resolveu tomar providências.
“Postei um comentário avisando que quando chegássemos a 3.000 eu fecharia o grupo”, ela conta. Hoje, são 3.030 associadas –outras 1.000 aguardam na fila o pedido ser avaliado. “Recebo em média 400 e-mails por dia”, revela Titina. Perfeccionista, no começo ela passava as madrugadas atenta às discussões.
Depois de 45 dias e algumas broncas do marido – avisando que ela estava perdendo muito tempo com algo que não rendia 1 real – resolveu abrandar a rotina. Agora, acessa a agenda três vezes por dia no computador de casa (de manhã, de tarde e de noite) e vigia os posts pelo celular. “Tenho que pelo saber o que está sendo discutido para não perder o fio da meada”, diz.
A maioria das Ablackers tem entre 35 e 60 anos e fez curso superior. Algumas são advogadas, donas de lojas ou arquitetas, várias dedicam-se a atividades filantrópicas, muitas se definem como “mães em período integral”. Por que o nome Agenda Black? “Me inspirei nos cartões de crédito”, explica Titina. “Tudo o que é black é exclusivo. A dica que está na agenda é a dica top”.
Com tantas informações sobre viagens, hotéis, restaurantes, joias, roupas, é claro que de vez em quando aparece a pergunta inevitável: “O q vcs fazem pra espantar olho gordo ??? HELP !!!!”. A maioria dos 32 comentários sugeria a mesma coisa. Seja para uma Ablacker, seja para uma simples mortal, a solução é a mesma: “Reza. Reza com fé !! :)”.
Jony Lan
Especialista em estratégia, marketing e novos negócios
jonylan@mktmais.com
Fontes: Veja, Exame