Estratégia via Benchmark | Via Uno se renova e cresce no rastro da rival Arezzo
Depois de substituir os sapatos de material sintético pelos de couro, marca gaúcha investe para sofisticar os pontos de venda
Sete anos após trocar as sapatarias multimarcas por unidades próprias, a Via Uno passa por um segundo "banho de loja" de olho nas mulheres das classes A e B. A marca gaúcha, que fechará o ano com 300 lojas em todo o mundo, vai remodelar suas unidades ao longo dos próximos cinco anos. Os tons pastéis, especialmente o marrom e o bege, remetem a rivais como a Arezzo, da qual a Via Uno se tornou concorrente direta ao elevar o preço de seus produtos e investir na estratégia de varejo próprio.
De acordo com Paulo Kieling, diretor de marketing da Via Uno, as novas lojas refletem a transformação do produto ao longo dos últimos anos: os sapatos, antes feitos com materiais sintéticos, hoje são predominantemente de couro. Os preços de produtos da marca mais que dobraram nos últimos anos: no verão, o valor médio de um par de sapatos Via Uno será R$ 120 - no inverno, pode dobrar. "A consumidora notou que o produto mudou. Agora adequamos o ponto de venda a ele", diz Kieling.
Ao abandonar as multimarcas, a Via Uno deixou de atender 2,4 mil varejistas pelo País. O retorno ao mercado "popular" se deu com o lançamento da linha Naturezza, em 2009. Feitos com materiais sintéticos, esses calçados se assemelham aos que a Via Uno produzia nos anos 90.
A entrada no varejo monomarca trouxe a reboque a decisão de transformar a Via Uno em uma companhia de moda, encerrando a fase industrial da empresa, fundada em 1991. Nos últimos anos, a Via Uno se desfez das fábricas próprias - hoje, toda a produção é terceirizada. Com faturamento de pouco menos de R$ 500 milhões, a empresa reduziu seu quadro para cerca de 300 pessoas, concentradas nas áreas de estilo e marketing.
Segundo Fernando Lucena, presidente do Grupo Friedman, que presta consultoria de varejo para marcas de calçados, a disputa entre Via Uno e Arezzo mostra como é difícil para uma empresa desse ramo manter-se à frente dos concorrentes. "O público feminino não é fiel. Mesmo que a empresa líder antecipe tendências, a cliente pode buscar algo novo", explica. Ele ressalta que, apesar de ter se aproximado da Arezzo, a Via Uno não navega em águas tranquilas no mercado de valor agregado: "Mesmo que a Arezzo tenha errado recentemente, ela está mais firmada nesse setor."
Desenvolvimento. O consultor em varejo Eugênio Foganholo diz que a ascensão da Via Uno reflete a pouca sofisticação do varejo calçadista nacional. "A experiência de compra nas sapatarias multimarcas é igual há 30 anos: o cliente vê o calçado na vitrine, pede para o vendedor e espera ele procurar no estoque", diz. A diferença, explica Foganholo, é que Arezzo e Via Uno permitem o contato direto da cliente com o sapato, o que faz diferença na hora da compra. Ele diz que o movimento da Via Uno, ao perceber essa necessidade, foi "bem feito". "Era uma área com pouca competição e carente desse tipo de atendimento."
Oficialmente, Via Uno e Arezzo não se assumem como grandes rivais. Kieling afirma que a Via Uno prioriza a consumidora de 20 a 40 anos das classes A e B. Já Anderson Birman, fundador da Arezzo, diz que "qualquer empresa do ramo de sapatos é concorrente". A Arezzo, também dona das redes Schutz e Ana Capri, iniciou o modelo de lojas próprias e produção terceirizada há 14 anos, seguindo o molde de gigantes como a Nike. Birman diz que a receita do grupo deve superar R$ 800 milhões em 2010.
Ao escolher um nicho sofisticado e buscar a internacionalização, uma das preocupações da Via Uno é manter a identidade visual - não importa aonde a expansão das franquias leve a companhia. Hoje, mais de 40% das lojas estão no exterior. Além de estar presente em locais com tradição na moda, como Paris e Milão, a empresa abriu mercados como Filipinas, Jordânia e Cuba. Até o fim do ano, chegará à Austrália com cinco unidades. "O clima do país e o gosto do consumidor são parecidos com o que observamos no Brasil. Isso facilita as coisas", diz Kieling.
Apesar de terceirizada, a fabricação de sapatos, acessórios e material de ponto de venda da Via Uno é concentrada no Brasil - a produção é de 6 milhões de peças ao ano. De carona na estratégia de gigantes como a rede de cafeterias Starbucks, a Via Uno desenvolve a estratégia de varejo em sua sede: os franqueados ao redor do mundo recebem um kit para montar a loja. "Queremos uma marca global. Por isso, o padrão tem de ser idêntico. Daí a necessidade de se definir tudo internamente", explica Kieling.
Para a Via Uno crescer mais rapidamente, mais cedo ou mais tarde sua produção deverá ser realizada em outros países devido à alta carga tributária brasileira e o custo Brasil. Algumas empresas já sabem como "burlar" legalmente e estrategicamente o problema dos impostos no Brasil. Outras já estão atuando com a cabeça no mundo global, tanto na gestão interna quanto na visão externa.
Abs,
Jony Lan
Consultor em estratégia, marketing e novos negócios
jonylan@mktmais.com
Fonte: Estadão