Estratégia: Carrefour vai instalar cinemas em seus hipermercados
Vários gurus do marketing e estudiosos de estratégia e de outras áreas da administração sabem que a dinâmica dos negócios sempre gera um "gap" nos modelos que satisfaçam as necessidades dos clientes. Na minha opinião, a adaptação gera uma necessidade constante de atualização, renovação e principalmente inovação nos modelos de negócios. É como se essa característica fosse algo genético das empresas. Não há empresa que sobreviva no seu meio se não tiver o gene da "inovação".
Já relatei no MKTmais o necessidade de diversificação, como o último artigo sobre o modelo de negócios em postos de gasolinas. O que eu acabei chamando de Cross Business in Channel Marketing (CBCM). Muito mais que uma simples diversificação, que é muito marcado pela necessidade da própria empresa em criar novos negócios, o Cross Business in Channel Marketing preenche justamente esse "gap" com estratégia de ampliação de portifólio via alianças estratégicas. Tudo isso se deve ao esgotamento das fontes de receita das empresas. Sua principal característica é a exploração de pessoas, clientes e potenciais consumidores. E normalmente não está relacionado com o core business de uma das empresas envolvidas.
Para explorar de maneira mais eficiente as grandes áreas ociosas dos hipermercados, o Carrefour Brasil firmou parceria com Inovação Cinemas para a construção de complexos exibidores dirigidos à classe C e que nos próximos sete anos deverão somar 200 salas em todo o País, com aporte aproximado de R$ 200 milhões, sendo uma parcela proveniente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Planejamento
A expectativa dos sócios é que a primeira sala esteja em funcionamento em janeiro de 2010 no Rio de Janeiro para aproveitar o período de férias. Uma equipe de engenheiros já está na unidade carioca do Sulacap desenvolvendo os primeiros detalhes da obra. Em abril, será a vez de São Paulo receber estrutura semelhante, a ser instalada no Bairro do Limão.
Por enquanto, mais oito unidades estão mapeadas para Brasília (DF), Belo Horizonte (MG), Vitória (ES) e São Paulo (SP) para a construção de complexos exibidores. Se tudo acontecer conforme o programado e a iniciativa for bem-sucedida, ocorrerá no mínimo a inauguração de quatro complexos anuais. Além dos 114 hipermercados existentes, as expansões futuras do Carrefour também vão garantir fôlego extra ao projeto.
A estrutura
Thierry Perrone, sócio da Inovação Cinemas juntamente com o empresário Adhemar Oliveira, conta que cada unidade terá entre seis e oito salas de cinema, totalizando 1,4 mil lugares. "O contrato de locação será diferenciado daqueles realizados com shopping centers e o Carrefour terá uma participação na venda dos ingressos", explica. Oliveira é responsável pela administração de 77 salas de cinema e tem participação no Cinema Arteplex e no Circuito Cinearte.
O executivo não detalha as condições do contrato estabelecido com a supermercadista dirigida por Jean Marc Pueyo, mas lista o prazo longo de financiamento e as taxas baixas de juros cobradas pelo BNDES como fatores preponderantes para que a operação seja vantajosa. "Os materiais empregados na obra serão mais simples e a arquitetura, diferenciada. Os custos serão até 20% menores em relação aos do Cinemark."
Pontos fortes
Os critérios para a instalação das salas de projeção são pontos-de-venda que precisem de incremento no fluxo de consumidores, tenham espaço ocioso e não possuam centros de compras nas proximidades. Perrone destaca que a oferta do serviço vai diferenciar a rede da concorrência.
Esboços da inovação
A ideia para a instalação de salas de cinema é antiga na rede: nasceu em 2004, depois de conversa de Perrone com um diretor executivo da multinacional. O sócio da Inovação pontua que naquela época a classe C já estava em ascensão, mas diz que agora o poder de compra dessa fatia da população está forte.
Pesquisa de campo
Em 2006, a antiga agência de publicidade do Carrefour, a Almap/BBDO, foi a campo pesquisar a viabilidade do projeto entrevistando 400 clientes de 20 hipermercados. "Descobrimos que as pessoas não frequentavam o cinema por causa do preço, da localização e do tempo: foi a confirmação do nosso planejamento estratégico", lembrou o investidor que também é dono da Investimage.
Operação
De acordo com Perrone, as salas terão formato stadium, projetores de 35 milímetros de última geração, projeção digital (via Rain) e qualidade de programação, com a mesma qualidade oferecida pelas salas de cinema concorrentes. "Queremos democratizar o acesso ao cinema e contribuir para o enriquecimento cultural dos moradores dos bairros onde as salas serão instaladas."
De acordo com Perrone, as salas terão formato stadium, projetores de 35 milímetros de última geração, projeção digital (via Rain) e qualidade de programação, com a mesma qualidade oferecida pelas salas de cinema concorrentes. "Queremos democratizar o acesso ao cinema e contribuir para o enriquecimento cultural dos moradores dos bairros onde as salas serão instaladas."
Por enquanto, não foi criado um nome para a nova rede de cinemas (eu sugiro "Carrefour Cineplex"), mais a marca Carrefour deverá estar presente, assim como as de possíveis empresas patrocinadoras. Os investidores garantem que os preços serão bons e o estacionamento, gratuito.
O sócio da Inovação Cinemas também será responsável pela operação do complexo do Bourbon Shopping Novo Hamburgo, pertencente ao Grupo Záffari, detentor de supermercados e shoppings no sul e em São Paulo.
Na tendência de aproveitar melhor os espaços, o Grupo Pão de Açúcar inaugurou em 2008 um powercenter, com a abertura de um atacarejo Assai dentro de uma loja da bandeira Extra. Nada mais do que o conceito de store in store, como forma de aumentar o ticket médio do cliente e de educá-lo pelas novas formas de compras.
Há tempos o modelo tradicional de hipermercados já está falido. A criação da área de serviços, a incrementação da publicidade, a geração de receita com aluguel de espaços internos, a cobrança de estacionamento em alguns casos, a implantação de postos de gasolina, instalação de drogarias, praça de alimentação, tudo para transformar o modelo de negócios dos hipermercados em centros de varejo, muito mais do que simples shoppings centers para a classe mais baixa, o fato é que os hipermercados estão ultrapassando os limites de simples lojas de auto-serviços para complexos com a cara dos shoppings e malls que encontramos em outras regiões do mundo.
É uma tendência sem volta. Esse movimento estratégico do Carrefour será acompanhado de perto pelos seus maiores concorrentes e certamente pensarão duas vezes se entram no mundo do entretenimento, business que não tem nada haver com o auto-serviço, com a venda de alimentos ou com o abastecimento da casa dos clientes. É o Cross Business in Channel Marketing aplicado: aproveitar as pessoas, clientes e consumidores a gastarem mais em um mesmo ponto de venda. Afinal, a localização e a estrutura dos hipermercados com seus enormes estacionamentos possuem os pilares centrais para qualquer empreendimento de varejo, o que vier à mais será lucro, certamente.
Abs,
Jony Lan
Especialista em estratégia, marketing e novos negócios
jonylan@mktmais.com
Fonte: DCI